O rosto: marca de passagem do tempo.

Tento ressignificar o conceito de beleza para me ver de uma forma mais sensível e bondosa.
O passar do tempo estava marcado nos olhos das pessoas. Na cidade, em meio a correria para o trabalho, as gerações se encontravam. Os idosos sentados à frente, antes da catraca. Os mais jovens, sentados depois do cobrador: alguns dormindo, outros conversando. Observando todo aquele contraste de rostos, de pessoas, de idades, minha imaginação tomou tanto conta da realidade que senti meus cabelos embranquecidos. As mãos enrugadas. A voz falha.
Envelheci internamente e nem vi o tempo passando. Lembrei que um dia desse, sentada no sofá, comecei a pensar no envelhecimento. No domingo, vi uma senhora de cabelos bem branquinhos e semblante bem feliz. Então, olhei para mim: sinto meu corpo mudando, me olho timidamente no espelho e tento sorrir. Assim, percebo que minha risada está mudando também. Tento olhar nos meus próprios olhos através do espelho, buscando neles vida e brilho.
Meu cabelo está maior. Um dia desse minha amiga disse que juba grande é boa no frio, porque esquenta as orelhas (é verdade). Também tenho em mim algumas espinhas renascendo e lembro de quando elas me incomodavam tanto na época da escola. Tento ressignificar o conceito de beleza para me ver de uma forma mais sensível e bondosa. Vejo o tempo passando tanto no meu próprio rosto quanto na face das pessoas ao meu redor.
Outro dia, comecei a questionar como estava construindo o futuro. Como eu lido com aquilo que acredito e se ajo de maneira honesta com os outros. Às vezes, sinto um medo tão grande! De estar fazendo algo que machuque a Deus ou outras pessoas. Que machuque a mim mesma também. Eu tenho 20 anos e não sei se estou trilhando as coisas no meu tempo ou só cavando e deixando guardados os medos. Vejo minhas amigas crescerem e fico muito orgulhosa!
De repente, ao virar o rosto, me assustei até com meu próprio reflexo borrado na janela do ônibus. Fechei os olhos cultivando a memória para recordar o caminho que estava fazendo. Não adiantava, não lembrava.
Então decidi estar no presente. Habitar nesse instante de tempo com carinho. E, com certeza, olhar alguma placa que pudesse informar em qual rua estava. Por mais que parecesse que o tempo era uma coisa rara, ele estava em abundância dentro do aparelho que faz tic tac. Então, peguei o relógio e entreguei para a mulher ao meu lado na tentativa de afastar aquele objeto de perto de mim.
“Eu não sei olhar as horas, mocinha”- respondeu surpresa.
Rebati: Eu também não. Calculei que em 20 anos saberia onde estava e agora não sei nem em qual rua é a minha parada.
Quando olhei o reflexo pela tela do celular, meu cabelo retornara a ficar preto. A rua clareou e reconheci que estava chegando em casa. A realidade bateu forte na imaginação e vi que minhas mãos ainda estavam sem rugas e minha voz não se alterara. A gente cria a realidade do outro a partir da nossa própria realidade também. Pensei que a moça ao meu lado sabia olhar bem as horas, mas o tempo é um mistério até mesmo para os mais sábios. Dizem que ele- o danado do tempo- fica marcado na gente, os amigos vão crescendo, os pais envelhecendo… Até o nosso piscar parece nos lembrar: os segundos estão passando. Do lado de cá, eu luto: que eu possa abraçá-los (o tempo, as pessoas, a mim mesma…) depressa, antes que todos se vão!